quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Brasil, ainda há esperança!



Brasil: ainda há esperança!

Existe uma cena no filme Aliança do Crime, que está em cartaz em todos os cinemas nacionais, que para mim reflete perfeitamente o que está acontecendo no Brasil hoje. O filme conta a história real de um mafioso da cidade de Boston, interpretado pelo ator Johny Deep, que faz uma aliança com a polícia para deletar os criminosos de um bando adversário ao seu.  Coincidências a parte, a cena que me chamou a atenção foi quando ele conversa com seu filho pequeno a respeito de seu comportamento em uma briga na escola e, ao repreendê-lo, assim o adverte: -Filho na vida não importa o que você faz, nem o porquê; o que importa é como você faz. Faça sempre o que for preciso, mas nunca na frente dos outros! Em outras palavras ele ensina ao filho que não importa o crime que ele cometa, desde que não deixe rastros, nem testemunhas! A história é velha, mas a lição é bem atual.  Daquela época para cá muita coisa mudou. Embora as mentes criminosas continuem pensando que nunca serão descobertas, às vezes se escondendo em cargos do mais alto escalão da República, a verdade é que os tempos mudaram!  A diferença é que hoje, ocultar crimes está cada dia mais difícil, já que todo crime deixa vestígios e um dia é descoberto. É só uma questão de tempo, polícia eficiente, justiça efetiva e povo exigente. Enfim, no Brasil de hoje, ainda há esperança!  


Sylvana Machado Ribeiro. 

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Somos todos Paris!




Publicado no correio Braziliense de 18/11/15. 

Somos todos Paris. 

Não importa o ângulo que se vê, hoje somos todos Paris! Tragédias  são como a morte, nos faz lembrar da vida. Ficamos todos chocados com o maior atentado terrorista que aconteceu ontem em Paris, não só pela tragédia em si, mas pela insegurança que isso trás para toda a humanidade. Por isso nada se compara ao que aconteceu ontem em Paris. O terror pelo terror! O mundo está aterrorizado, por isso, somos todos Paris. E o que significa sermos todos Paris? Significa que já não estamos seguros em lugar algum! Não importa a nossa nacionalidade, estamos todos em perigo! Somos todos Paris! Não importa a religião, somos todos Paris. Não importa onde moramos, somos todos Paris. Não importa a ideologia, somos todos Paris. Não podemos nos esquecer que Liberdade, igualdade e fraternidade são princípios universais que surgiram na França. Então, somos todos Paris, por que se não formos todos Paris hoje, amanhã será muito tarde! O mundo precisa se unir pela Paz mundial e assim seremos todos Paris, sempre!

Sylvana Machado Ribeiro.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Tribunal de Justiça deve julgar matéria omissa em acórdão

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
RELATORA : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI
ADVOGADA : SYLVANA MACHADO RIBEIRO


DECISÃO:

Trata-se de agravo nos próprios autos, interposto contra decisão que não admitiu recurso especial, este fundamentado no art. 105, III, "a", da Constituição Federal. O acórdão recorrido, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, ficou assim ementado (fl. 93 e-STJ):

PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUBSTITUIÇÃO DE BEM PENHORADO. DISCORDÂNCIA DO EXEQUENTE. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO DE RECONHECIMENTO DO IMÓVEL COMO BEM DE FAMÍLIA. DECISÃO MANTIDA.
1. A impenhorabilidade de bem de família traduz-se em matéria de ordem pública, arguível em qualquer momento e não se sujeita à preclusão.
2. A substituição da penhora é medida que depende da expressa concordância da parte exeqüente, a quem incumbe aferir se a substituição é apropriada, ou não, à satisfação do crédito em execução.
3. Não prospera a pretensão de substituição da penhora, porquanto não houve concordância do exeqüente que, inclusive, manifestou-se totalmente contrário ao pleito de substituição do bem penhorado.
4. Para que o imóvel penhorado seja reconhecido como bem de família deve haver pedido expresso da parte executada, de modo que não basta a genérica alegação de impenhorabilidade nas razões recursais de agravo de instrumento contra decisão que indefere pedido de substituição de penhora.
5. Agravo de Instrumento conhecido, mas não provido. Unânime.


Os embargos de declaração opostos pelo ora agravante foram rejeitados (fls. 118/123 e-STJ).No recurso especial, apontou-se contrariedade aos artigos 535, II, 620 e 655, do Código de Processo Civil e 1º da Lei n. 8.009/1990. Buscou o recorrente a anulação do acórdão devido a omissão sobre a tese da impenhorabilidade de bem de família. Defendeu a substituição da penhora de bem de família em razão da previsão legal. Argumentou que houve pedido implícito para exclusão da penhora do único imóvel que serve de moradia à família.O Tribunal de origem não admitiu o recurso, por entender não configuradas as contrariedades alegadas e ser necessário o exame de prova.No agravo, o recorrente ratifica as violações indicadas no especial, e pleiteia a reforma da decisão.Assim posta a questão, passo ao exame do recurso.

A despeito da oposição de embargos de declaração, o Tribunal de origem não apreciou a tese da impenhorabilidade do bem de família, sob o fundamento de que o pedido era apenas de substituição do imóvel penhorado por outro crédito do executado. O recorrente, contudo, vem debatendo a matéria da impenhorabilidade desde o primeiro grau e deve-se salientar que a obediência ao princípio processual da congruência, ou adstrição, não se desnatura quando se analisa pedido da parte, ainda que implicitamente veiculado. O exame do pedido de impenhorabilidade do bem de família foi omitido nos acórdãos que julgaram o agravo de instrumento e os embargos de declaração, o que impede o conhecimento direto da matéria no âmbito do recurso especial, impondo-se a volta dos autos à origem para novo julgamento dos embargos de declaração. Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. OMISSÃO EXISTENTE.
1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é firme no entendimento de que deve a parte vincular a interposição do recurso especial à violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, quando, mesmo após a oposição de embargos declaratórios, o tribunal a quo persiste em não decidir questões que lhe foram submetidas a julgamento, por força do princípio tantum devolutum quantum appellatum ou, ainda, quando persista desconhecendo obscuridade ou contradição argüidas como existentes no decisum.
2. Afirmada a invalidade de ato demissional por praticado por autoridade incompetente, não fica prejudicada a apreciação das demais nulidades suscitadas, anteriores, relativas ao próprio processo administrativo disciplinar, que, acaso acolhidas, determinarão não somente a reedição do ato de demissão em si, mas também do próprio processo disciplinar, desde quando praticado o ato considerado nulo.
3. Não apreciadas as nulidades alegadas, impõe-se a declaração de nulidade do acórdão que julgou os embargos declaratórios, a fim de que o vício no decisum seja sanado.
4. Recurso provido. (REsp 737.761/MG, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 18/12/2006, DJ 04/06/2007 p. 434)

Em face do exposto, conheço do agravo e dou parcial provimento ao recurso especial, determinando o retorno dos autos ao TJDFT, para que seja examinado o ponto omisso suscitado nos embargos de declaração (art. 544, § 4º, II, "c", do CPC), devendo ser suspensos os atos de alienação do bem imóvel, enquanto não dirimida a controvérsia na origem. Por conseguinte, fica prejudicada a análise da Medida Cautelar n.25.164/DF. Traslade-se cópia desta decisão para aqueles autos. Intimem-se.Brasília (DF), 06 de novembro de 2015.

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI.

Relatora.

sábado, 15 de agosto de 2015

Lei de Improbidade Administrativa

Essência Penal das Sanções Cíveis da Lei de Improbidade Administrativa

(Artigo publicado pela Editora JC em 05/09/14)

Em que pese à natureza cível da Lei de Improbidade Administrativa é importante ressaltar que as penalidades cominadas por ela têm, em sua essência, natureza penal. E isso se dá devido à gravidade das sanções cominadas, que apesar de não serem penas privativas de liberdade, cerceiam diretos fundamentais do indivíduo, causando-lhes efeitos tão nefastos e ainda piores que as penas privativas de liberdade. Por isso as sanções cominadas pela Lei de Improbidade Administrativa podem ser consideradas sanções civis de efeitos penais, uma vez que, se aplicadas cumulativamente tornam a vida do réu quase inviável, pois, apesar de não haver privação da liberdade, as sanções cominadas são tão graves, e os efeitos tão nefastos, que impossibilitam o pleno exercício de vários outros direitos civis do condenado, tão importantes como a liberdade. Com a aplicação cumulativa de todas as sanções previstas na lei, a vida do réu se torna praticamente impossível, pois, ele não consegue mais sequer arrumar um emprego para se sustentar o que, às vezes, é muito pior do que ter a liberdade cerceada pela pena privativa de liberdade. Ele se torna um “preso-solto”, pois, apesar de solto lhe são cerceados todos os direitos políticos e ainda alguns direitos civis, o que demonstra a essência penal das sanções cominadas na Lei de Improbidade Administrativa. Os atos de improbidade estão descritos de forma exemplificativa nos artigos 9, 10 e 11 da Lei 8429/92; a Lei de Improbidade Administrativa. E as sanções cominadas nos mesmos artigos, podendo ser cumuladas ou não, conforme disciplina o art.12 da mesma lei. Sendo assim, é importante registrar que a jurisprudência tem entendido que para a configuração do ato de improbidade administrativa é necessário à tipificação da conduta, assim como ocorre no tipo penal. Em outras palavras, o ato de improbidade administrativa é “tão crime como o crime”, devido a sua gravidade e, por isso, possui os mesmos requisitos do tipo penal, incluindo o dolo. Nesse sentido, assim como no tipo penal, é necessária a configuração do dolo, para que seja tipificado o ato de improbidade administrativa, sob pena de improcedência do pedido por absoluta atipicidade.


Sylvana Machado Ribeiro.


terça-feira, 2 de junho de 2015

Venire Contra Factum Proprium e Bem de Família

Artigo publicado no Direito e Justiça, do Correio Braziliense, em 23/02/15.

Venire Contra Factum Proprium  e Bem de Família.


A observação da aplicação do Princípio do Venire Contra Factum Proprium nos atos judiciais tem sido cada vez mais comum no Processo Civil Brasileiro. A presunção de legalidade dos atos judiciais tem impedido a correta aplicação do escopo do processo, devido a sutiliza da aparente legalidade de alguns atos judiciais eivados de ilegalidade em face da conduta contraditória de juízes, Magistrados, explique-se, que se cobrem pelo manto da aparente legalidade, apesar da sua contradição implícita, que é vedada pelo ordenamento jurídico e que torna as decisões absolutamente ilegais por ferir a boa-fé processual.   

O juiz, muito mais que as partes, deve primar pela conduta ilibada e pela boa-fé na condução dos atos processuais, pois ele é o presidente, o condutor do processo. Portanto, é a parte responsável pela efetiva realização da justiça. Assim, não basta ser o juiz honesto, ele tem que agir honestamente. E o juiz que, na condução do processo, age de forma contraditória está ferindo não só o devido processo legal, como, também, o direito da parte de ver na aplicação da lei, ao caso concreto, a realização da verdadeira justiça!

O art.14, inciso II, do CPC, diz que, é dever das partes, e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo, procederem com lealdade e boa-fé. Se é dever das partes, é mais ainda do magistrado, que, como parte especial e condutora do processo, tem a responsabilidade crucial de efetivar no processo a verdadeira justiça. Assim, não se pode admitir jamais conduta desleal ou de má-fé do magistrado sob pena de inviabilizar a própria justiça.

Infelizmente, em nossa militância forense, temos visto cada dia mais a contradições nos atos judiciais que inviabilizam o devido processo legal, embora algumas sequer são percebidas pelas partes. Isso talvez esteja acontecendo devido à confiança que os cidadãos depositam na pessoa do juiz, acreditando que eles não erram. Nada mais absurdo. Se não errassem não precisaria de recurso. A justiça é cara, mas a injustiça é mais cara ainda! Portanto, um bom advogado ainda é a principal arma contra as arbitrariedades judiciais. 

Vejamos um exemplo de ato judicial contraditório e, portanto, ilegal, ocorrido em processo de execução que quase inviabilizou a aplicação da Lei 8009/90 que rege o Instituto do Bem de Família. Aconteceu em um processo de execução, em que o exeqüente indicou o único bem imóvel do executado à penhora (bem de família por presunção legal), e apesar da prova pré-constituída de que se tratava de bem de família, o magistrado determinou a penhora da casa, em violação frontal a Lei 8009/90, norma de ordem pública, que veda qualquer constrição ao bem de família. Houve, neste caso, clara violação do Venire Contra Factum Proprium na decisão judicial. Isto por que o magistrado com o seu comportamento anterior omissivo (ignorando as provas apresentadas pelo exeqüente e confirmadas pelo executado de que se tratava de bem de família), agiu em contradição às provas dos autos, determinando a penhora. E, dessa forma, prejudicando o executado, que tinha as provas em seu favor, ou seja, frustrou a expectativa do devedor de que teria a aplicação correta da lei 8009/90, que veda a penhora em bem de família.

Configurada, portanto, flagrante contradição na conduta judicial. Isso porque, na medida em que o juiz, com seu comportamento omissivo, ignorou as provas dos autos, para, posteriormente, determinar a penhora do bem de família, favoreceu o credor, ao desconsiderar, em sua decisão, a prova feita pelo executado. Prejudicou, assim, sobremaneira, o direito do devedor de não ter sua casa penhorada. Portanto, com sua conduta contraditória, o magistrado feriu a expectativa do devedor de ter a aplicação correta da lei 8009/90, que veda a penhora em bem de família. Houve, em conseqüência, clara violação do Venire Contra Factum Proprium. 

Não fosse a oportunidade de se questionar a validade da decisão através do recurso cabível (Agravo de Instrumento com pedido de Efeito Suspensivo), a parte jamais teria a oportunidade de corrigir a decisão judicial contraditória e ilegal e teria tido sua casa, seu lar, sua residência, enfim, seu bem de família ilegalmente penhorado.

Enfim, a observação do Princípio da Venire Contra Factum Proprium no Processo Civil é medida que se impõe de forma primordial, a fim de se eliminar contradições nos atos judiciais, que decidem a vida das pessoas de forma quase sempre irreversível.

Sylvana Machado Ribeiro é advogada, Graduada em Processo Civil pelo Instituto de Direito Processual Civil Brasileiro. Pós-Graduada em Direito e Jurisdição pela Escola da Magistratura do Distrito Federal.  



domingo, 22 de março de 2015

Direito Penal. Nexo Causal.











quinta-feira, 5 de março de 2015

Direito do Consumidor. Seguro de Vida.

EMENTA: CIVIL. SEGURO DE VIDA. CONTRATAÇÃO. CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE ESPECIFICAÇÃO DO TIPO DE SEGURO NO DOCUMENTO ASSINADO PELO CONTRATANTE. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. OMISSÃO DOLOSA DA SEGURADORA. INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR.INDENIZAÇÃO CABÍVEL.

DEIXANDO A SEGURADORA DE ESTIPULAR, NITIDAMENTE, AO CONSUMIDOR, QUE SE TRATAVA DE SEGURO DE VIDA EXCLUSIVO EM VIRTUDE DE ACIDENTES, NOTADAMENTE AO SE TRATAR DE SEGURADO EM IDADE AVANÇADA E DE BOA-FÉ, DEVE ELA ARCAR COM A INDENIZAÇÃO EM CASO DE MORTE NATURAL, QUANDO AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO INDICAM QUE ERA ESSA MODALIDADE A QUE O SEGURADO PRETENDIA FILIAR-SE.

ACÓRDÃO: CONHECER E IMPROVER O RECURSO DA SEGURADORA, UNÂNIME.

Neste caso, paradigmático, ocorreu que uma viúva beneficiária de um seguro de vida total (por morte natural e/ou acidental), deixado por seu marido (o segurado), teve o pagamento de indenização do seguro negado pela seguradora, sob a alegação de que o seguro contratado pelo “de cujus” somente cobriria a morte por acidente. O segurado, no entanto, à época da realização do seguro, possuía outro seguro de vida total, com outra seguradora, o que comprovou que a verdadeira intenção dele era a de adquirir um seguro de vida total, ou seja, que cobrisse os casos de morte acidental e/ou natural.

A beneficiária conseguiu comprovar, em juízo, que a verdadeira intenção do segurado era de realizar um seguro de vida total. Comprovou, também, que a conduta omissiva dolosa da seguradora, que nunca enviou a apólice ao segurado, como determina a lei, foi determinante para manter o segurado em erro, que acabou comprando “gato por lebre”, ou seja, comprou um seguro de vida por morte acidental pensando que estava comprando um seguro de vida total.

Essa omissão dolosa da seguradora culminou na anulação da cláusula restritiva do tipo de seguro (somente por morte acidental), para que o seguro contratado fosse considerado como sendo o do tipo total (por morte acidental e/ou natural), como era a intenção do segurado, e, assim, resultou na condenação da seguradora ao pagamento de indenização, à beneficiária, no valor do contrato de seguro de vida por morte natural.

Sylvana Machado Ribeiro. 

terça-feira, 3 de março de 2015

A Jurisdição e os Limites Efetivos da Competência Jurisdicional


A Jurisdição e os Limites Efetivos da Competência Jurisdicional:

No direito brasileiro existem matérias comuns a várias searas do direito como a Jurisdição e os Limites Efetivos da Competência Jurisdicional. Ocorre que existe uma grande confusão nessas matérias e, por isso, elas se tornam tão difíceis quanto essenciais ao bom funcionamento do sistema jurídico como um todo. É bom lembrar que essas matérias envolvem a compreensão de vários direitos ao mesmo tempo como o Direito Penal, o Direito Administrativo, o Direito Civil e o mais fundamental de todos: o Direito Constitucional.

Nesse sentido esse emaranhado de conceitos e direitos tem contribuído para a morosidade e inefetividade da justiça que a cada dia se torna mais desacreditada. Ninguém se entende. E isso é péssimo, pois, quase tudo termina no Supremo Tribunal Federal que está cada vez mais abarrotado de processos infindáveis.  E o tempo passa, as coisas não se resolvem, e a impunidade prepondera em face da morosidade e complexidade da lei e da jurisprudência oscilante em nossos tribunais. É aquela história: onde muitos mandam, ninguém obedece.

Assim, no nosso ordenamento jurídico, que é feito de milhares de leis e inúmeras decisões contraditórias, quem se beneficia com essa confusão é sempre o réu, o criminoso, o delinqüente. E quem se prejudica é o cidadão de bem, aquele que paga todos os impostos, que, às vezes, são cobrados indevidamente! 

Quando um cidadão comum comete algum crime ele é processado pelo Ministério Público (titular da Ação Penal Pública) que ajuíza a Ação Penal, no juízo ou foro competente (o Juiz de Direito de 1ª Instância), desde seu início até decisão final transitada em julgado. Disso ninguém tem dúvida. Todos conhecem a figura do Promotor de Justiça, do juiz e do advogado.

Mas, o que causa confusão é quando acontece o tal “Foro Privilegiado”. Esse ninguém entende. Mas, o que é realmente o Foro Privilegiado? E quem pode ser titular do Foro Privilegiado? E quais os atos que podem ser abrangidos pelo Foro Privilegiado? Os crimes comuns e/ou os Atos de Improbidade Administrativa? E o que determina o foro privilegiado? É a natureza da infração ou do agente (denunciado) que cometeu o ilícito? São tantas dúvidas e tantas matérias envolvidas que fica muito difícil interpretar tudo de forma harmônica e teleológica. 

Para entendermos essa matéria temos que começar pelo conceito de Jurisdição. Afinal, o que é a Jurisdição?  Jurisdição é o poder-dever dos juízes de dizer o direito. Esse poder é privativo dos órgãos jurisdicionais. Somente os juízes podem dizer o direito.

Mas, existem muitos juízes no território nacional. Será que todos eles podem dizer o direito de todas as pessoas e em qualquer lugar? Não, não podem. Seria dar muito poder a um só juiz, vocês não acham? E para que o juiz não tenha “super poderes” é que o ordenamento jurídico determina que seu poder de dizer o direito seja limitado pela competência jurisdicional. A competência jurisdicional é, na verdade, o limite da jurisdição do juiz, ou seja, é a limitação do poder do juiz de dizer o direito. A competência do juiz é atribuída pela Constituição Federal, pelas Leis de Organização Judiciária, e pela legislação correlata (os Códigos de Processo Penal e Processo Civil).

A competência é determinada por vários critérios, mas, o primeiro critério a ser observado é o critério do lugar da infração, ou seja, não pode um juiz de Goiás julgar um crime cometido no Rio de Janeiro, simplesmente, por que, ele não tem competência jurisdicional para tanto.

Assim, na medida em que os crimes acontecem, vai se determinando a competência dos juízes para julgar as causas e essa competência, uma vez definida, se torna definitiva, ou seja, não pode ser prorrogada por nenhum outro fato que venha acontecer posteriormente. A isso damos o nome de perpetuação da jurisdição. A jurisdição uma vez estabelecida por meio da competência jurisdicional não pode ser modificada em nenhuma hipótese. Isso é o que garante a efetividade da jurisdição, ou seja, o cumprimento dos Princípios da Segurança Jurídica, do Devido Processo Legal e do Juiz Natural. Esses princípios, juntos, garantem que o cidadão somente será julgado pelo Juiz constitucionalmente competente para a causa e nunca, jamais, por um outro desprovido de competência jurisdicional (Juiz incompetente).

Essa é uma das garantias mais importantes na Constituição Federal em termos de Direito Processual, ou seja, a garantia de que só seremos julgados pelo juiz naturalmente competente. É o que chamamos de Princípio do Juiz Natural. E a obediência ao Princípio do Juiz Natural é a mais importante das garantias constitucionais. É fundamental e irrenunciável, na medida em que, juiz incompetente não pode dizer o direito, fora de sua competência, sob pena de violação direta a um Direito Público Subjetivo Constitucional: o de ser julgado somente pelo Juiz Natural. A violação da competência jurisdicional é afronta direta a própria Constituição Federal e causa nulidade absoluta do processo, independentemente de sua fase, ou de seu objeto (Processo Penal-Crime, ou Processo Civil-Improbidade Administrativa). 

Mas, então, por que ocorre tanta lide envolvendo a determinação de competência, se essa já é pré-atribuída pela Constituição Federal? É por que os critérios de determinação de competência são vários e devem ser interpretados harmônica e conjuntamente, ou seja, não depende, unicamente, de uma só lei (Constituição Federal ou Lei Adjetiva), mas, sim, da interpretação harmoniosa de várias leis, incluindo, também, a lei substantiva (Código Penal e Leis Especiais). Esses critérios apesar de objetivamente descritos na lei adjetiva dependem, também, da interpretação da Lei Substancial, ou seja, da Lei Penal quanto à tipificação de crimes e da Lei Civil ou Administrativa quanto à descrição dos Atos de Improbidade Administrativa, por exemplo. Por isso a grande dificuldade de se fixar o foro competente. Mas, uma vez definida a competência jurisdicional essa não poderá ser modificada jamais: ela se tornará definitiva e perpétua.

Então, por que, às vezes, o processo demora anos e anos para só depois se ter uma decisão definitiva sobre qual seja o verdadeiro Foro Competente? Por que tanta demora? É por que a determinação da competência depende, também, dos fatos que serão julgados e de quem os praticou? Como assim? Não somos todos iguais perante a lei? Sim, somos. Mas, igualdade significa que somos iguais na medida de nossas desigualdades. Nesse sentido, não podemos igualar os desiguais. E isso significa que mesmo sendo iguais, as nossas diferenças de função na sociedade (ser cidadão comum ou agente político) pode ser fato determinante para a fixação de competência, assim como, também, os atos cometidos por nós: se forem crimes, ou se forem, simplesmente, atos de improbidade administrativa.

Todos esses fatores influenciarão na determinação do juízo competente. Em outras palavras: não pode um juiz penal julgar atos de improbidade administrativa por que incompetente quanto à matéria. Assim, se o cidadão é acusado de cometer um crime e verifica-se logo no recebimento da denúncia que o ato que ele cometeu não é crime, e sim ato de improbidade administrativa, por exemplo, nesse caso, o processo será remetido para o foro competente, porque, o juiz penal é absolutamente incompetente para julgar atos de improbidade administrativa. Portanto, não pode o juiz penal julgar atos de improbidade administrativa por ser absolutamente incompetente, ou seja, sua incompetência é absoluta em razão da matéria.   Assim como não pode o juiz civil julgar crimes.

Nesse sentido a determinação da competência depende quase sempre de quem faz a denúncia ou a petição inicial da ação civil. Daí a grande importância da participação do Ministério Público bem como dos Advogados na condução da justiça.

Enfim, sem a colaboração dos operadores do Direito (MP e advogados) bem preparados e conscientes de seu papel essencial na condução dos processos, não há efetivação da jurisdição e, por conseqüência, da verdadeira justiça. 

Sylvana Machado Ribeiro é advogada, Pós-graduada em Processo Civil pelo IBDP, Pós-graduada em Direito e Jurisdição pela Escola Superior da Magistratura do DF.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

O que é " Vontade de Constituição"?


MINHA CARTA PUBLICADA NA FOLHA DE SÃO PAULO, NA COLUNA LEITOR, DO DIA 17/02/12.
"A intensidade da força normativa da Constituição apresenta-se, em primeiro plano, como uma questão de vontade normativa, de vontade de Constituição." Wille Zur Verfassung.  

 O QUE É "VONTADE DE CONSTITUIÇÃO"?
  
Dizer que a Lei da Ficha Limpa é inconstitucional, por que barra a candidatura de pessoas ímprobas e desonestas, antes do trânsito em julgado de uma sentença, é rasgar a Constituição Federal. Afinal, se fizermos uma interpretação teleológica  e harmoniosa da Carta Magna entenderemos que, neste caso, a  interpretação da Lei da Ficha Limpa, que trata de causas de inelegibilidade, deve ser harmoniosa com a vontade de constituição do povo.  E o que é a vontade de constituição? Vontade de constituição é, para os leigos, a interpretação popular da Constituição Federal, e não a jurídica. Em outras palavras: é a real vontade popular. E isso significa que deve prevalecer sempre a vontade da sociedade e não a vontade dos poderes constituídos, porque, no fundo quem faz a constituição é a sociedade, o povo. E muitas vezes a vontade do povo não é exatamente a vontade dos representantes eleitos pelo voto popular e nem dos juízes. E qual é a diferença disso na prática? A diferença está em que, muitas vezes a vontade do povo não é exatamente a mais correta juridicamente, mas, mesmo assim, deve prevalecer. Em outras palavras: entre o rigor da lei e a vontade popular, essa última deve prevalecer sempre, quando se tratar de interpretação da Constituição Federal. Em outras palavras e parafraseando o Ministro Gilmar Mendes: “até as pedras sabem”... que o que o povo realmente quer é que a Lei da Ficha Limpa seja considerada constitucional.  Que seja feita a vontade popular!

Sylvana Machado Ribeiro é advogada em Brasília. 

domingo, 18 de janeiro de 2015

Relações Homoafetivas: União Estável ou Sociedade de Fato?

Relações Homoafetivas: União Estável ou Sociedade de Fato?
(por Sylvana Machado Ribeiro)



Certo dia fui despachar com um Juiz de Família, para requerer uma decisão liminar, em uma Ação de Busca e Apreensão de Menor, e escutei o seguinte comentário: “Doutora, não é a justiça que é complicada, são as pessoas!” Eu nunca me esqueci dessa lição e sempre que pego uma nova causa eu me pergunto: até que ponto as relações entre os envolvidos é realmente complicada? Até que ponto a justiça pode, realmente, resolver problemas que, quase sempre, são conseqüências de muitos e muitos anos de frustração e infelicidade?

Nas ações de família nunca sabemos realmente o que causou o problema, nem quando e nem o porquê, mas, de uma coisa sempre temos certeza: as pessoas são complicadas e as relações entre elas mais complicadas ainda. Por isso, nas causas que envolvem questões de família, os magistrados devem ter um preparo psicológico, diferenciado de outros juizes, para julgar os fatos sem se envolver, mantendo uma distância emocional dos jurisdicionados, para não cometer injustiças, e isso não é uma tarefa fácil para a maioria dos juízes, que, na verdade, devem julgar os fatos (o que acontece com as pessoas) e não as pessoas em si (o que elas são em sua essência). E fazer essa distinção, entre julgar os fatos e não as pessoas, é que é o cerne da questão.

Nesse sentido, uma questão que tem despertado muita polêmica, em todos os ramos do direito, é a relativa à natureza jurídica das relações homoafetivas, devido à ausência de lei que regulamenta a matéria. Estaria o judiciário realmente preparado para julgar seus semelhantes, sem se envolver emocionalmente, quando se trata de questões tão polêmicas como essa? Afinal, é muito difícil essa missão da magistratura: julgar as causas, com total imparcialidade, principalmente quando se trata de questões que despertam os mais diversos e complexos sentimentos em vários segmentos da sociedade. Será que realmente a magistratura está preparada para isso?

É preciso entender que ainda não foi definida, nem por lei, nem pela jurisprudência, qual seria a natureza jurídica das relações homoafetivas: se união estável (Direito de Família) ou sociedade de fato (Direito Civil). Assim, na ausência de definição legal ou jurisprudencial sobre a matéria, os juízes seguem julgando, unicamente, com base na analogia, nos princípios gerais de direito e em sua convicção íntima. Assim, as relações homoafetivas ainda não podem ser tratadas como união estável, apesar da tendência ser nesse sentido. Enfim, existe jurisprudência nos dois sentidos, tanto nos Tribunais de Justiça, como no Superior Tribunal de Justiça, que ainda não se posicionou, definitivamente, a respeito da matéria.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, na órbita do direito privado, está um passo atrás do direito público, que, surpreendentemente, já tem decisões importantes que consideram as relações homoafetivas, como união estável, para efeitos dos direitos previdenciários. E isso é uma grande evolução!

Na Justiça do Trabalho as questões que envolvem as relações homoafetivas são geralmente às relativas ao direito previdenciário, mas, não são, por isso, mais fáceis de julgar, na medida em que envolvem, também, o conceito de relação homoafetiva. Assim as questões que dependem da interpretação da natureza jurídica das relações homoafetivas (se são união estável ou se são sociedade de fato) tem sido resolvidas de forma totalmente subjetiva, a critério exclusivo de cada juiz, por ausência de lei específica. Portanto, qualquer julgamento de envolva essa questão terá um cunho totalmente subjetivo, a depender dos valores e conceitos pré-concebidos de cada magistrado. E é aí que mora o perigo: quando temos que julgar somente com base na analogia e em valores subjetivos, corremos o risco de cometer enormes injustiças, em detrimento da verdadeira justiça, que só pode ser feita, realmente, com fundamentação em leis justas e alicerçadas em princípios constitucionais. Se não for assim, corre-se um enorme risco de se cometer verdadeiras “injustiças judicializadas”, ou seja, na falta de lei especifica o que prevalecerá será a analogia, os princípios gerais de direito, e a opinião pessoal e subjetiva de cada magistrado, e isso causa uma enorme insegurança jurídica.

Uma questão muito importante, para a magistratura trabalhista, é a relativa aos direitos previdenciários dos casais homoafetivos, ou seja, seria legal deixar pensão ao companheiro homossexual, sem ferir a Constituição Federal? Estariam os critérios da legislação previdenciária sendo preenchidos em consonância com o conceito de união estável expresso na constituição federal? Ou a lei estaria ferindo a própria Constituição Federal?

Sobre esse assunto temos duas decisões do Superior Tribunal de Justiça que apontam no sentido de se reconhecer a união estável entre pessoas do mesmo sexo para efeitos previdenciários. A primeira decisão foi em 13/12/2005, no Recurso Especial 395.904-RS, quando o Ministro Relator Hélio Quaglia Barbosa decidiu que é devida a concessão de pensão por morte ao companheiro homossexual, desde que, preenchidas as exigências da Lei n. 8.213/1991, comprovadas a qualidade de segurado do de cujus e a convivência afetiva e duradoura entre o falecido e o autor.

A segunda, em 04/02/2010, no Resp 1.026.981-RJ, que revolucionou o entendimento anterior, quando a Ministra Relatora Nancy Andrighi entendeu que “comprovada a existência de união afetiva entre pessoas do mesmo sexo, é de se reconhecer o direito do companheiro sobrevivente de receber benefícios previdenciários decorrentes do plano de previdência privada do qual o falecido era participante, com os idênticos efeitos da união estável, ainda que não esteja expressamente inscrito no instrumento de adesão, isso porque a previdência privada não perde seu caráter social só pelo fato de decorrer de avença firmada entre particulares. Assim, se por força do art. 16 da Lei n. 8.213/1991, a necessária dependência econômica para a concessão da pensão por morte entre companheiros de união estável é presumida, também o é no caso de companheiros do mesmo sexo, diante do emprego da analogia que se estabeleceu entre essas duas entidades familiares.” Esse julgamento, no entanto, ainda não terminou, e no dia 08/02/2011, em Questão de Ordem, a Turma deliberou remeter os autos, à Segunda Seção, para o julgamento da quaestio relativa ao reconhecimento da união homoafetiva com os mesmos efeitos jurídicos da união estável.

Importante perceber, assim, que, nas duas decisões do Superior Tribunal de Justiça, existe uma evolução do direito previdenciário, em relação à lei civil, que permanece inerte, em relação ao reconhecimento das uniões homoafetivas, como união estável. Assim, o direito previdenciário está evoluindo, à frente do direito privado, no sentido de ser atribuída normatividade idêntica às uniões estáveis, aos relacionamentos afetivos entre pessoas do mesmo sexo, com os efeitos jurídicos daí derivados, evitando-se que, por conta do preconceito, sejam suprimidos direitos fundamentais aos casais homoafetivos.

Mas, felizmente, hoje, toda essa polêmica está ficando no passado, pois; a partir do histórico julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, no último dia 05/05/11, não há mais dúvidas de que os casais que vivem em União Estável, sejam de sexos diferentes ou do mesmo sexo, têm os mesmos direitos civis. Em outras palavras, o Supremo decidiu, em decisão unânime e com efeitos vinculante e erga omnes, que as Uniões Homoafetivas devem ser equiparadas às Uniões Estáveis, para todos os efeitos legais. Assim, a partir de então, os casais homoafetivos passam a ter os mesmos direitos assegurados aos casais heterosexuais que vivem em União Estável, sejam eles, direitos civis, de família, previdenciários, públicos, ou quaisquer outros que venham a pleitear, com base nessa equiparação reconhecida pela mais alta corte de Justiça de nosso país. Ou seja, o Supremo reconheceu que o direito de amar, ser amado, constituir família, viver em convivência marital, adotar crianças, separar, brigar, reconciliar, deixar herança, pensão, enfim, o direito de amar e ser amado, de sofrer e de ser feliz é amplo, irrestrito e não admite qualquer tipo de preconceito. Enfim, todos têm o direito de escolher com quem viver e ser feliz, com todas as conseqüências jurídicas que isso possa significar.

Fica aqui uma questão para reflexão: até que ponto podemos diferenciar os direitos de casais heterossexuais que vivem em união estável, dos casais homoafetivos? Pode mesmo o Estado impedir que pessoas convivam em união estável e adquiram direitos decorrentes dessa convivência, simplesmente, por que não são de sexos diferentes? Penso que não, pois, o Estado não pode interferir na vida privada das pessoas, principalmente, em relação a questões tão intimas, como o relacionamento de pessoas que vivem em “união estável”, independentemente do sexo. Afinal, o direito de conviver é um dos mais importantes na formação da personalidade das pessoas que, a depender de suas escolhas, podem se tornar felizes ou, totalmente infelizes. E a felicidade, definitivamente, não pode ser julgada por ninguém.

(Artigo publicado na Revista da ANAMATRA, ano XXIII, nº 61, mês de junho de 2011, páginas 32 a 34)

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Da Liberdade Provisória Com ou Sem Fiança


DA LIBERDADE PROVISÓRIA COM OU SEM FIANÇA:



Quando se fala nos institutos da Liberdade Provisória e da Fiança existem muitas dúvidas em relação a sua aplicação prática. Isso por que o Código de Processo Penal não é expresso a respeito de sua aplicação, ou seja, não diz quais os crimes que admitem fiança e/ou liberdade provisória, mas sim quais não admitem. Então, a interpretação dos institutos deve ser feita “a contrario sensu” e, à luz da ausência dos requisitos dos art.311 e 312 do CPP, que permitem a prisão preventiva dos indiciados, o que torna mais difícil seu entendimento.


A Liberdade Provisória Com ou Sem Fiança é um instituto de Direito Processual Penal que concede liberdade, sob certas circunstâncias, ao réu que está na iminência de ser preso, ou foi preso, em flagrante, ou em decorrência de sentença de pronúncia, ou de sentença penal condenatória, mas que ainda não transitou em julgado. Por outro lado é instituto incompatível com as prisões cautelares (provisória ou preventiva), por natureza. Para conceder a liberdade provisória, no entanto, é necessário analisar os requisitos legais dos artigos 311 e 312 do CPP, “a contrario sensu”, ou seja, ausente qualquer daqueles requisitos necessários para a manutenção da prisão cautelar, deve-se conceder a liberdade provisória, com ou sem fiança, a depender do tipo de crime. A isso chamamos interpretação “a contrario sensu”.


Bom, a princípio qualquer crime admite liberdade provisória sem fiança. Isto por que deve prevalecer o Princípio Constitucional da Inocência que diz que ninguém é culpado até que seja condenado por uma sentença penal condenatória transitada em julgado, então, a regra é a liberdade e deve ser respeitada sempre. Ademais, a liberdade provisória sem fiança somente pode ser concedida pela autoridade judicial, desde que fundamentada nos casos do art.310 do CPP (casos de exclusão de ilicitude - art.23 CP) e seu §único que remete aos requisitos do art.311 e 312 do CPP. Assim, o juiz pode conceder liberdade provisória, a qualquer criminoso, independentemente do crime cometido, desde que a decisão seja fundamentada na lei. Afinal, em tese, não existe crime insuscetível de liberdade provisória sem fiança, o que existem são circunstâncias pessoais do acusado, que serão analisadas em cada caso concreto pelo juiz, e que podem torná-lo insuscetível de liberdade provisória.


Já a liberdade provisória com fiança é diferente. Isto por que existem crimes inafiançáveis, por expressa determinação legal, e crimes afiançáveis. Assim, a depender do crime, pode ser concedida liberdade provisória com fiança, até mesmo pela autoridade policial. Já para os crimes inafiançáveis não se pode conceder fiança, nem mesmo pelo juiz, ou seja, caso haja necessidade de libertar o réu, a autoridade judicial deverá fazê-lo sem, no entanto, arbitrar qualquer fiança. Isto é a regra.


Mas quais são os casos de liberdade provisória com fiança? A princípio todos os crimes que forem apenados com detenção, independentemente do tamanho da pena, ou com prisão simples, admitem fiança. Também, admitem fiança todos os crimes cuja pena mínima cominada for de reclusão, desde que seja menor que 2 anos. A contrario sensu, todos os crimes apenados com reclusão, cuja pena mínima seja igual ou maior que 2 anos, não admitem fiança, embora sejam suscetíveis de liberdade provisória sem fiança. Os crimes hediondos, o tráfico de drogas, a tortura e o racismo, não admitem fiança. Os crimes tributários e os crimes contra o sistema financeiro, mesmo que punidos com detenção, também não admitem fiança. Assim, os crimes que não admitem fiança são os mais graves e, apesar da gravidade, a liberdade provisória sem fiança poderá ser concedida pela autoridade judicial, nos casos em que assim a lei o permitir. E a lei aqui deve ser considerada como um todo, ou seja, a Lei Penal em harmonia com a Lei Processual Penal e a Constituição Federal.


Mas, afinal, o que é fiança? Fiança é um sucedâneo de determinadas prisões processuais (em flagrante, em decorrência de pronúncia e em decorrência de sentença penal condenatória), representada por uma caução em dinheiro ou bens preciosos, pagos pelo réu ao Estado, para substituir, provisoriamente, sua prisão cautelar, nas hipóteses previstas em lei. Ela visa, também, assegurar, na hipótese de condenação, o pagamento das custas do processo, eventual multa e, se possível, indenização à vítima ou sua família pelo dano ex delicto. Trata-se, enfim, de uma maneira civilizada de substituir a prisão cautelar daquele que ainda não foi definitivamente condenado por determinado bem de valor (dinheiro ou bens preciosos), enquanto não transitar em julgado a sentença.


E quando se concede a liberdade provisória, quais são as condições legais impostas ao réu para que ele possa se livrar solto? O réu deverá cumprir algumas determinações judiciais, por isso, o nome do instituto, por que a liberdade é provisória, ou seja, sob determinadas circunstâncias (comparecimento regular à justiça, proibição de viajar sem autorização judicial, proibição de freqüentar certos lugares, etc...), a sua liberdade é concedida embora, parcialmente reduzida, sob certos aspectos. Ou seja, para mantê-la, mesmo que provisoriamente, há que se aceitar e cumprir as condições legais impostas pelo juiz. Se assim não fosse não seria a liberdade provisória, seria absoluta.


Por último, não se pode falar em liberdade provisória em caso de decretação de prisão cautelar (provisória ou preventiva) pela incompatibilidade natural dos institutos. Portanto, em caso de ilegalidade de prisão cautelar, caberá, tão-somente, relaxamento da prisão pelo juiz (de ofício), ou até mesmo a concessão de Habeas Corpus, a depender do caso concreto.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Não é a toga que faz o Juiz!



Carta publicada na Folha de São Paulo Online, na coluna Leitor, no dia 02/10/11.

“De tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantar-se o poder nas mãos dos maus, o homem chega a rir-se da honra, desanimar-se de justiça e ter vergonha de ser honesto” Rui Barbosa.


Mais uma vez o Supremo Tribunal Federal tem a oportunidade de mostrar que realmente uma Justiça forte é um dos principais pilares da sociedade e imprescindível para a manutenção da ordem e da democracia. Ontem, dia 28/09/11, foi adiado o julgamento sobre a competência natural do CNJ, órgão constitucional de fiscalização da magistratura, criado pela Emenda 45, que modificou o art. 103-B da Constituição Federal, que hoje delimita a competência do CNJ, em seu parágrafo 4º, inciso III, ao estabelecer que compete ao Conselho Nacional de Justiça “receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário..., sem prejuízo da competência disciplinar e correcional dos tribunais... e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa;” Esse é o texto expresso na Constituição Federal, cuja constitucionalidade está sendo questionada pela Associação dos Magistrados Brasileiros. E nesse contexto a Corregedora Nacional de Justiça, Ministra Eliana Calmom, declarou para a imprensa que “limitar os poderes da Corregedoria do CNJ é o primeiro caminho para a impunidade da magistratura, que hoje está com gravíssimos problemas de infiltração de bandidos que estão escondidos atrás das togas”. E eu acrescentaria que não é só a magistratura e sim todos os três poderes da República! E isso é público e notório; não precisava ela dizer. E, justamente, por isso, que, agora, mais do que nunca, é necessário o Supremo se manifestar no sentido de manter a competência constitucional do CNJ. Afinal, desde sua criação, o CNJ tem cumprido, fielmente, sua função de fiscalização do judiciário, que, antes dele era uma verdadeira “caixa preta”: intocável e irrepreensível! Afinal, ninguém está acima da Constituição Federal, nem mesmo a Magistratura Nacional. O CNJ deve permanecer com sua função constitucional de fiscalização e punição de quem deve ser punido: os “bandidos juízes”e não os juízes honestos, que ainda são a maioria! Afinal, quem não deve não teme! Sendo assim, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) não deveria temer esse julgamento e sim entender que a manutenção da competência constitucional de fiscalização do CNJ é sim, mais do que nunca, essencial para preservação das prerrogativas constitucionais dos juízes: independência, imparcialidade e honestidade! Parabéns ao CNJ que não deve se intimidar na luta contra os “bandidos”, sejam eles de toga, ou não! Afinal, não é a toga que faz o juiz!
Sylvana Ribeiro é advogada em Brasília-DF desde 1992.

sábado, 10 de janeiro de 2015

Diferenças entre Revelia e Efeitos da Revelia no Processo Civil Brasileiro



As diferenças entre Revelia e Efeitos da Revelia no Processo Civil Brasileiro.  


Os operadores do direito devem ser, antes de tudo, intérpretes da lei. E isso significa da lei no sentido geral, ou seja, de todo o sistema jurídico que alcança a lei, a jurisprudência e a doutrina a serem aplicadas ao fato jurídico. Ora, a lei não existe sozinha, sem o fato jurídico para lhe dar vida. O fato jurídico é o componente humano que dá vida à lei. Sem ele a lei tornar-se “letra morta” sem nenhuma utilidade. É como o corpo sem a alma: não há vida, não há razão de ser. Isso por que no direito é como na vida, tudo está interligado. Em sendo assim, para aplicarmos corretamente as leis temos que ter uma compreensão do sistema como um todo. E esse exercício de adequação do fato jurídico à lei, conhecido como subsunção, nada mais é do que a interpretação da “letra da lei” para aplicá-la ao caso concreto, dando-lhe vida. E essa tarefa de interpretação da lei faz parte da essência do ofício do advogado. E isso significa narrar os fatos, mostrar o direito e provar ambos, demonstrando, assim, a subsunção, ou seja, o liame subjetivo e a correlação entre o fato ocorrido e a lei, a fim de efetivar o direito do cliente.


E para que isso aconteça, cabe ao advogado, a tarefa não menos importante de se utilizar do instrumento processual adequado, ou seja, do tipo de processo e procedimento corretos para o caso específico, que deverá escolher dentre vários regidos pela lei processual (civil, penal ou trabalhista) a depender do direito a ser aplicado. Sem isso não há direito que se concretize por melhor e mais explícito que seja. E isso é tarefa privativa do advogado que tem o conhecimento técnico jurídico preciso que o torna capaz (capacidade postulatória) para ajuizar a ação adequada e, assim, representar seu cliente diante da Justiça, efetivando o direito pleiteado. Enfim, sem o trabalho técnico do advogado não há direito efetivo.

E para efetivar o direito do cliente precisamos do processo. O processo não é nada mais do que o instrumento de efetivação do direito em si. Se errarmos no processo, perdemos o direito. E isso é tão sério que já existe jurisprudência que condena os advogados por “perda de uma chance”. Isso significa que, em casos de culpa ou negligencia do causídico, ou seja, quando o cliente perde a única e última chance de teria para conseguir a realização de seu direito por culpa de seu advogado, este  será responsabilizado, civilmente, por desídia no seu ofício.  Afinal, o processo não é tão somente uma pilha de papel. O processo é a vida do cliente. É a vida das partes nele envolvidas. E como tal ele merece o nosso maior respeito, zelo e total dedicação, pois, ele é o meio adequado (processo) para se atingir um fim (o direito).

Quando se julga um fato jurídico temos duas frentes a observar: a matéria fática (os fatos em si) e a matéria de direito (a lei a ser aplicada). Mas se essas frentes do fato jurídico estão interligadas, como saber distinguir uma da outra?  Até que ponto a matéria fática influencia a matéria de direito ou vice-versa? Seria possível julgar somente uma das duas? Como? Em que circunstâncias isso pode ocorrer?

A regra é a analise das duas frentes em conjunto, ou seja, a subsunção é justamente a aplicação da lei aos fatos no caso concreto. Mas, quando que os fatos não interferem na lei a ser aplicada? Em outras palavras: quando será julgada somente a matéria de direito?

A matéria de direito é apreciada isoladamente quando se tratar de direitos indisponíveis, quando os fatos já foram provados por documentos ou quando não há outras provas a serem produzidas. Em outras palavras, há direitos que são comprovados somente por documentos que a lei exige (direitos indisponíveis) e, assim, independem de provas dos fatos, basta juntar os documentos que a lei determina para comprovar o direito. Por isso se tornam matéria de direito, ou se prova com documentos, ou não se prova.

É, por exemplo, o caso do direito de propriedade de bens imóveis, que, apesar de se tratar de direito disponível, se provam somente com o registro público. Se o sujeito não tiver o registro não adianta ele contar os fatos, ou seja, que comprou de fulano ou sicrano, no dia tal, na presença de beltrano, etc... Nada disso terá relevância se ele não apresentar o registro do imóvel. Por isso a questão é unicamente de direito, ou seja, ou se prova da forma prevista em lei ou não se prova. Ou seja, só se prova pelo e como a lei determina, independentemente do que tenha ocorrido. Por isso chamamos matéria de direito: ou seja, só importa é o que a lei diz. Os fatos sequer são avaliados se o sujeito não apresentar os documentos que comprovem o seu direito que é especificado na lei. Não sou eu que estou dizendo que a propriedade só se prova com o registro: é a lei, por isso, a matéria é unicamente de direito.

Por outro lado temos uma regra processual civil que diz que se os fatos não forem contestados no prazo legal ocorrerá revelia. E revelia nada mais é do que a falta de contestação. Mas, os efeitos da revelia só se apresentam em relação à matéria fática e nunca quanto à matéria de direito. Então, quer dizer que mesmo sem a contestação o réu ainda poderá ganhar a causa? Sim por que seu direito não se perde por que não contestou, se ele comprovar com documentos que é o proprietário, mesmo sendo revel, ele não perderá a ação. É isso mesmo? Sim. Mesmo havendo revelia a matéria de direito não é prejudicada. Pois, em caso de revelia, o que será considerado verdadeiro, em desfavor do réu, são os fatos contados pelo autor, e não a matéria de direito propriamente dita. Isso por que a matéria exclusivamente de direito independe dos fatos. Em outras palavras: quando a matéria é unicamente de direito, pouco importa os fatos. Em sendo assim, mesmo que o réu perca o prazo da contestação, ou seja, se torne revel, ele não perderá seu direito se o provar com os documentos exigidos pela lei. Basta que junte os documentos que comprovam seu direito de propriedade mesmo que extemporaneamente. Ademais, se o autor não juntou os documentos essenciais que comprovem o seu direito, ele perderá a causa de qualquer maneira, mesmo o réu sendo revel, pois, nesse caso o juiz não poderá julgar contra os documentos apresentados.  

Imagine, por exemplo, que o autor entrou com o pedido de adjudicação compulsória, mas não comprovou o pagamento do imóvel com recibos. Neste caso, mesmo o réu sendo revel, o autor não ganhará a causa, simplesmente porque, alegou ser dono do imóvel e não comprovou o pagamento. E pagamento se prova com recibo. Enfim, em se tratando de matéria unicamente de direito ganha quem apresentar os documentos essenciais para provar o seu direito, independentemente da revelia ou de seus efeitos. Simples assim.

Mas, então, quando ocorrem os efeitos da revelia? Os efeitos da revelia só ocorrem quanto à matéria de fato. Por exemplo: suponhamos que o sujeito perdeu a vaga no concurso que tenha sido aprovado por que não entregou os documentos solicitados dentro do prazo estipulado no edital. O fato é que ele perdeu por que chegou atrasado e não conseguiu entregar os documentos. Ele, inconformado, ajuíza uma ação querendo que os documentos sejam aceitos e ele seja aprovado no concurso. A matéria fática se resume ao fato dele não ter conseguido entregar os documentos no prazo legal. A matéria de direito é que para ele ser aprovado deverá ser titular dos documentos solicitados no edital. Ele na inicial demonstra que não teve culpa e não entregou os documentos por motivo de força maior, mas que ainda pode entregar por que não teve culpa da não entrega. A parte ré não contesta a ação e, assim, ocorrem os efeitos da revelia. Ou seja, ele comprova o motivo de força maior que o impediu de entregar os documentos no prazo do edital e, com a revelia do réu, esses fatos se tornam verdadeiros. Assim, então, comprovado os fatos, por falta de contestação, a ação deverá ser julgada procedente. Ele ganha por que provou os fatos, ou seja, provou que não entregou os documentos por motivo de força maior e, portanto, não perdeu o seu direito de entregar os documentos e tomar posse no concurso.  

Essa a diferença entre matéria de fato e matéria unicamente de direito: quando a matéria é de fato e de direito, temos que comprovar ambos e se houver revelia perdemos a ação porque admitimos que os fatos narrados pelo autor são verdadeiros. Já na matéria unicamente de direito os fatos não têm muita importância e mesmo que não sejam contestados no prazo legal (revelia) o desfecho do processo vai depender da prova do direito e não dos fatos. Quem provar o direito ganha a ação. Portanto, nem sempre que houver revelia o autor ganhará a ação. Para chegarmos a essa conclusão basta interpretar as regras sobre a revelia e seus efeitos que estão nos artigos 319  e  seguintes do Código de Processo Civil[1]·.

Por outro lado, em se tratando de processo com mais de um réu, não ocorrerão os efeitos da revelia se um deles contestar a ação. E isso é porque na medida em que um réu contesta a ação, os fatos se tornam controversos, o que significa que não podem ser considerados verdadeiros sem que sejam feitas as provas necessárias. Não se podem considerar verdadeiros os fatos que foram contestados apenas por um dos réus, a não ser que na instrução probatória o autor consiga prová-los a seu favor. Mas, aí é uma questão de prova e não simplesmente de efeito da revelia, pois, nesse caso, eles não se operam. Portanto, nesse caso, ganhará a ação quem conseguir provar os fatos que embasam o seu direito. Assim, não se pode falar em efeitos da revelia quando somente um dos réus contestou o pedido do autor. Essa é a outra exceção sobre os efeitos da revelia que se encontra no art.320, inciso I, do CPC.

Enfim, apesar das normas processuais serem complexas,  elas não podem ser interpretadas, isoladamente, sem a conjugação das normas materiais e adjetivas. Caso isso ocorra caberá ao advogado consertar as injustiças cometidas bastando para isso que se utilize dos recursos cabíveis, disponíveis na Lei Adjetiva e que servem, justamente, para se corrigir possíveis erros cometidos na aplicação do direito ao caso concreto. Afinal, essa é a função essencial do advogado na administração da justiça: corrigir os erros que prejudiquem a aplicação do direito ao caso concreto.                              

Sylvana Machado Ribeiro é advogada em Brasília desde 1992. Pós-graduada em Processo Civil pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual Civil.




[1] “Art. 319. Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor.
Art. 320. A revelia não induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente:
I - se, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação;
II - se o litígio versar sobre direitos indisponíveis;
III - se a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento público, que a lei considere indispensável à prova do ato.”
Art. 321. Ainda que ocorra revelia, o autor não poderá alterar o pedido, ou a causa de pedir, nem demandar declaração incidente, salvo promovendo nova citação do réu, a quem será assegurado o direito de responder no prazo de 15 (quinze) dias.
Art. 322. Contra o revel que não tenha patrono nos autos, correrão os prazos independentemente de intimação, a partir da publicação de cada ato decisório.
Parágrafo único O revel poderá intervir no processo em qualquer fase, recebendo-o no estado em que se encontrar.”

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Limites Temporais do Contrato de Seguro de Vida.

Meu artigo, publicado no caderno Direito e Justiça, do Correio Braziliense, do dia 02/04/2012.

 Limites Temporais no Contrato de Seguro de Vida:

Existe decadência do direito do beneficiário pleitear a indenização relativa a contrato de seguro de vida realizado entre segurado e seguradora? Não, o que existe é prescrição. E o prazo da prescrição é o da regra geral do art.205 do CC, ou seja, de 10 anos, visto que a lei não estipula outro prazo específico. Sendo assim, a prescrição começar a contar a partir da data da negativa de pagamento da indenização pela seguradora. Antes disso não há violação ao direito do beneficiário de receber o seguro, e, em conseqüência, não há como se falar em decadência, e sim em prescrição, uma vez que essa nasce com a violação do direito. Portanto, mesmo que se falasse em decadência, por hipótese, esta somente poderia ocorrer a partir da violação do direito, ou seja, a partir da negativa da seguradora em pagar a indenização ao beneficiário. Não se pode decair de um direito que sequer nasceu. Simples assim.

O contrato de seguro de vida é atípico, na medida em que é realizado entre duas partes, mas, em benefício de um terceiro, ou seja, o beneficiário. Assim, não se pode falar em decadência de direito que ainda não existe, visto que, esse direito só nasce com a morte do segurado.

Dessa forma, enquanto o segurado estiver vivo somente ele poderá discutir os termos do contrato e seus efeitos, mesmo que estes digam respeito ao um terceiro, ou seja, o beneficiário. E o direito do beneficiário de receber o seguro de vida só se efetiva a partir da morte do segurado, momento em que nasce seu direito de receber a indenização. Antes disso, ele tem somente expectativa de direito. Por isso, até a negativa da seguradora não há que se falar em prescrição, visto que seu direito, que nasceu com a morte do segurado, ainda não tinha sido violado, pois a violação acontece com a negativa do pagamento. E é com sua violação, a negativa do pagamento, que começa a contar o prazo para o beneficiário discutir as cláusulas do contrato. Antes disso, não há que se falar em prescrição ou decadência, pois; o beneficiário não pode “decair” de um direito que sequer existe! Só a partir do efetivo nascimento do direito do beneficiário, que acontece com a morte do segurado, é que ele pode tomar alguma atitude: ou receber o seguro, o se negar a receber, ou discutir seu valor ou mesmo sua natureza.

Assim, impossível alegar decadência de um direito que ainda não existia para o beneficiário, antes da morte do segurado. A prescrição só pode ocorrer a partir da violação do direito, ou seja, a partir do momento em que é negado ao beneficiário o pagamento do seguro, que foi contratado por outra pessoa (o segurado) e que o beneficiou. Assim, o art. 206 do CC é expresso quando diz que a prescrição só começa a correr da data do fato gerador, ou seja, da morte do segurado, ou da violação do direito, ou seja, do momento em que a seguradora se negar a pagar a indenização do valor do seguro!

Portanto, somente a partir da morte do segurado é que nasce o direito do beneficiário, e, portanto, a prescrição desse direito somente pode ocorrer após essa data e nunca antes. Como se trata de violação de direito, que nasceu com a negativa de pagamento, então, não há que se falar em decadência, simplesmente por que a lei não prevê essa hipótese de decadência, e sim, de prescrição nos termos do art.205 do CC.

Enfim, concluímos que, na verdade, não existe decadência do direito de receber o seguro de vida, para o beneficiário, e sim, prescrição, nos termos do art.205 do CC. Nesse sentido, o prazo para contagem, do prazo de prescrição, começa a correr a partir da data da negativa do pagamento da indenização ao beneficiário, pela seguradora. Ou seja, da violação do direito do beneficiário de receber o valor do seguro, contratado pelo segurado, com a seguradora, em contrato de seguro de vida. Antes disso, não se pode falar em prescrição e muito menos em decadência. Entender de modo diverso seria inviabilizar o recebimento de qualquer seguro de vida. Ou seja, na linguagem popular, seria o mesmo que admitir a morte do direito, antes mesmo de seu nascimento! Seria, então, o “aborto” dos contratos de seguro de vida!

Sylvana Machado Ribeiro é advogada em Brasília.